Muitas vezes quando lemos algo que nos toca particularmente usamos a expressão “ressoou cá dentro”, “fez eco em mim”. Muitas das experiências de fé são assim e a imagem que alguns ateus gostam de usar (para ridicularizar, obviamente) é “Normalmente, o eco é maior quando o interior está vazio” (L.K.). Será o vazio uma coisa má quando pensamos nesta interacção entre ciência e fé?
Há uma história que me impressionou desde miúdo quando a li. Um rapaz soube de um monge que era considerado o homem mais sábio do mundo. Como tinha muitas dúvidas foi ter com ele para saber as respostas. O monge acolheu-o e serviu-lhe chá. Enquanto enchia a chávena, o rapaz fez-lhe várias perguntas filosóficas que o inquietavam. O monge continuava a encher a chávena. O rapaz continuava as suas questões até que percebeu que o monge não parava de encher a chávena. Naturalmente, essa começou a transbordar e o rapaz – “Olhe que já não pode meter mais chá com a chávena cheia” – ao que o monge, finalmente olhando para ele, responde – “É como a tua cabeça. Enquanto não se esvaziar, não há que eu diga que possa entrar”.
O vazio não é ausência de ideias, pensamentos, sentimentos, mas simplesmente este “haver espaço” para acolher aquilo que o quotidiano, com todas as incertezas, nos reserva. Quando algo faz eco em nós, segue-se um momento de clareza. E o vazio é o espaço que criámos em nós para poder acolher a novidade do outro, da comunidade, do mundo, de Deus.
O diálogo entre ciência e fé exige esta arte de sabermo-nos esvaziar, isto é, de não ter pensamentos, questões, ideias, perder tudo, para estar inteiramente disponível a acolher os pensamentos, questões e ideias dos outros. É uma dinâmica difícil, mas quando diz respeito à ciência e à fé – domínios tão distintos – é a melhor forma de agir e garantir que dessa interacção surjam ideias novas, em vez de estarmos aprisionados nas que já temos e que, na prática, não estamos dispostos a mudar.
Com isto não me refiro – como muitos poderão pensar – à mudança de convicções. Não se trata de converter alguém à existência de Deus, ou converter alguém à inexistência. Essa é uma experiência mais pessoal do que podemos pensar.
A mudança a que me refiro é a de mentalidade. A melhor forma de aprofundar as convicções que temos é procurar juntos as relações entre as coisas. Depois, as dificuldades e diferença de ideias provêm sobretudo da linguagem.
De todas as linguagens pensava que a filosófica era a mais universal. Mas ao longo do tempo tenho vindo a aperceber-me de que as abordagens podem ser diferentes, tornando-a menos universal. Foi depois da morte de um grande amigo que descobri qual a linguagem universal no âmbito da ciência e da fé. Dizia ele,
”Procurei como filósofo compreender o mundo. Estranhamente, sinto que o mundo tem um lado incompreensível. O mundo talvez exista não tanto para ser compreendido, mas mais pra ser amado.”
Alfredo Dinis SJ
Encontra eco em ti a linguagem do amor como a mais universal para um diálogo entre ciência e fé?